Mad Max – Estrada da Fúria: Muito além dos filmes de ação

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Mad Max – Estrada da Fúria (Mad Max – Fury Road, 2015) reconstrói um gênero que há muito tempo não apresenta coisas novas. Um gênero idealizado para os dias nos quais você não quer pensar, certo? Mas Mad Max, não. E só por isso, a produção já merece ser vista de maneira diferente.

Logo de entrada, o filme não apresenta os personagens de maneira clássica. Os primeiros minutos mostram qual é o local e mais ou menos quem são as pessoas dessa história, para então te jogar dentro dos acontecimentos. A partir daí, você faz parte da ação, colocado em um mundo completamente diferente, como dito aos quatro ventos: Distópico e destruído, onde a água e o combustível são tesouros.

Em poucos instantes, depois de se habituar com o quê o diretor George Miller passa na tela, você entra em contato com seus personagens, sem ter uma ideia clara de seus objetivos, de seus porquês e para onde vão. Max (Tom Hardy) deixa claro que tem um trauma – referência aos filmes anteriores -, e é só. Furiosa (Charlize Theron), surge capitalizando não só a beleza de uma mulher forte, mas também a profundidade de um personagem cheio de nuances que aparecem à medida que o filme se desenrola.

Assim, para acrescentar ao processo narrativo, chega à tela uma combinação de imagens e cores que evidenciam uma beleza no caos, uma composição de imagens cuidada; pensada para criar, em quase todos os enquadramentos, um sentido maior do que somente o avançar da história.

Em conjunto com tudo isso, é possível perceber personagens complexos, com um passado real, que nos faz entender quem eles são a cada nova fala ou interação. Belíssima estratégia para deixar o público ligado ao todo, não só às explosões e cores. E claro, essa combinação desenvolvida para o longa drena o espectador para os objetivos dos seres que estão na tela. Colocam em evidência mulheres disputando de igual para igual com os homens. E deixa claro que as personagens femininas buscam a liberdade física enquanto Max procura a liberdade ou fuga de seus problemas psicológicos.

“You know hope is a mistake. If you can’t fix what’s broken, you’ll go insane”.

A beleza “escondida” na criação de George Miller

Não dá para negar que o uso de locações reais em conjunto com a inserção moderada de efeitos especiais garante uma imersão ainda mais interessante em Mad Max – Fury Road. Isso também coloca em destaque o cuidado com a forma como esse filme será visto pela audiência. Esses detalhes tornam-se ainda mais claros graças a forma como o longa-metragem consegue despertar sensações tanto por conta de todo o conceito por trás do design de produção, direção de arte e fotografia, quanto pela edição que apresenta opções não ortodoxas, como a opção por Frame Rate menor em alguma cenas, garantindo um resultado ainda mais interessante nos segmentos de stress. Outro fator interessante é a presença da trilha sonora em quase todos os momentos do longa, fazendo com que a tensão e a atenção de algumas fases seja ainda mais agudas. E olha, eu sou fã do esquema “menos é mais”, mas em Mad Max, a trilha funciona como o tempero ideal para cada momento da trama.

Logo, essa junção de fatores torna-se capaz de despertar blocos de sensações e também encantar desde o público que busca somente por diversão até quem procura mais nuances dentro de uma história.

Estética vs História

Um detalhe interessante sobre a pré-produção do longa, contado por Miller, é que o filme surgiu a partir de storyboards e posteriormente ganhou um roteiro, o que deixa claro que ele pensou primeiro em como isso seria visto para então inserir a história por trás das imagens, mas sem abrir mão da qualidade – importância – dos diálogos e da profundidade dos personagens.

Ai entra outra grande sacada do diretor, convidar Eve Ensler, autora de O Monólogo da Vagina, para ser consultora do roteiro e das atrizes. Detalhe que resulta em todo um conceito amplo da presença das mulheres no longa, não como objetos decorativos ou somente para “enfeitar os quadros”. Isso torna o entendimento de frases como, “Nós não somos objetos”, ou dos nomes que cada uma das personagens carrega: Capable, The Dag, Toast the Knowing, Cheedo the Fragile, ainda mais fácil.

Em conjunto com essa proposta, ainda temos a abordagem do fanatismo religioso, o uso do poder para se manter no poder, controle da massa, entre outras camadas… Tudo isso apresentado sem verborragia; somente com imagens, atuações bem delineadas e uma direção planejada. Proposta que garante ao filme tanto a possibilidade de ser visualizado como uma produção de ação e explosões quanto como uma narrativa com mensagens e interpretações mais profundas.

Com certeza, uma obra para ser apreciada, revista e entrar para o grupo de filmes que devem redefinir a forma e as possibilidades no momento de contar uma história, seja de ação ou não, assim como os primeiros Mad Max redefiniram – ou definiram – a maneira de apresentar um mundo pós-apocalíptico.

E assim, mesmo com toda essa gama de atributos, infelizmente, a obra não foi bem recebida em diversos mercados, já que uma grande parcela do público não conseguiu ir além do que está no vídeo. Mas, como sempre, arte é referência e cada um recebe e processa a informação da maneira que é capaz naquele momento. Um filme que já nasceu com as características de um clássico, que ganha nuances a cada vez que é visto, mas por isso carrega o estigma das obras não compreendidas de forma completa em seu tempo.

Entrevista de George Miller à Vice. Vale assistir para entender um pouco mais da cabeça por trás do filme.

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